quarta-feira, 11 de junho de 2008

Dos lixos ao luxo

Nem sempre é simples eleger apenas um item para os artigos, embora seja o ideal. Para este, destaco três: a) uma recente pesquisa sobre cultura; b) outra pesquisa sobre a educação; c) a liberdade de imprensa, comemorada no último dia 07.


Sobre cultura - motivado pelas intermináveis festas juvenis -, já me referi, em outro artigo, ao processo de esvaziamento do sentido existencial da atual década. Para explicar o processo, destaquei como um dos responsáveis a retirada do elemento ideológico de signos políticos, culturais e educacionais, itens que deveriam solidificar a sociedade.


Disse que a indústria do entretenimento nunca produziu tanto lixo. Responsabilizei os "intelectuais" que têm aprovado muita coisa ruim sob o verniz da diversidade, liberdade de expressão e até democracia! Exemplifiquei o que seria lixo cultural por meio das "músicas" de competições de som automotivo: algo pra lá de chulo.


Pois bem. Em recente pesquisa, acerca da "música" - item no qual o Brasil é, contraditoriamente, um dos melhores e piores do mundo - não são destacadas as aberrações dos "sons automotivos". Todavia, o que aparece entre os preferidos está distante do que se poderia qualificar como grandes elaboradores e/ou elaborações nesse campo artístico.


Senão vejamos: a) cantores mais citados: Leonardo, Roberto Carlos, Ivete Sangalo, Zeca Pagodinho e Daniel; b) duplas sertanejas: Zezé Di Camargo/Luciano e Bruno/Marrone; c) bandas: Calypso e Sorriso Maroto. Entre universitários, a preferida é a cantora Ana Carolina.


É claro que gêneros e estilos de cada um são diferentes, mas algo une a maior parte de seus produtos: a pieguice intimista, mesmo que alguns desses artistas a manifestem em ritmos alucinantes, daqueles de "tirar o pé do chão e jogar as mãozinhas pra cima". Às vezes, o olhinho fechado também vale. No repertório de todos, é exceção o que foge disso.


Em leitura política, isso comprova a supremacia do individualismo; a percepção da vida - pela arte (música) - não extrapola o egótico. Logo, quanto mais barulhento e vazio de conteúdo for o produto cultural, melhor. Outra leitura é a que aponta para o despreparo de educação formal à absorção de bens culturais mais elaborados; ou seja - lembrando Carlos Drummond - àqueles bens em que, p. ex., a palavra "sono", necessariamente, não precisaria rimar com "outono"; poderia rimar com a palavra "carne ou qualquer outra..."


Um dos motivos do despreparo formal da educação relaciona-se à carência de bons professores no ensino das diferentes linguagens. Poucos contribuem para que o conhecimento artístico-cultural dos alunos extrapole a massificação do lixo cultural imposta pela mídia. Comprovação disso: em outra pesquisa é apontado que apenas 5% dos melhores alunos formados no ensino médio vislumbram ser professores. Motivos: baixos salários e desprestígio social. Resultado: para o magistério, com exceção, encaminham-se os alunos mais frágeis intelectual e culturalmente. Assim, instaura-se um ciclo vicioso; é possível que a maioria, em breve, veja no lixo da cultura algo de luxuoso!


Último tema: liberdade de imprensa. É alívio não ver programações e produções culturais - por piores que sejam - censuradas por regime político. No entanto, a censura ideológica persiste, mas, subjetivamente. Jornalistas da mídia comercial (geralmente, mal pagos) podem até denunciar corrupções de políticos e outros, mas não podem estimular reflexões sobre a perversidade do capital. Se fizerem, as demissões são invitáveis. Assim é a censura das democracias ocidentais. A plena liberdade de imprensa ainda está por vir. Quando vier - aí, sim - valerá até pular feito pipoca nos trios elétricos. Será um luxo só!



Fonte: Diário de Cuiabá

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